sábado, 30 de maio de 2015




Torcicolo muscular congénito


Babila Carvalho com a colaboração de Vânia Machado, 


O torcicolo muscular congénito é a terceira causa mais frequente de anomalia musculoesquelética congénita. O diagnóstico e tratamento precoces assim como a participação ativa dos pais são fundamentais para o sucesso terapêutico desta patologia.

O que é?
O torcicolo muscular congénito (TMC) consiste numa deformidade do pescoço envolvendo um encurtamento do músculo esternocleidomastoideu (ECM) devido a um processo de rotura ou fibrose muscular decorridos durante a gestação ou no decurso do trabalho de parto, que é detetada ao nascimento ou após o mesmo. Constitui a terceira causa mais frequente de anomalia musculoesquelética à nascença, ocorrendo em menos que 1a 2% dos recém-nascidos, sendo mais comum naqueles com apresentação intrauterina pélvica. 

Algumas destas crianças também podem apresentar displasia da anca, o que ocorre em cerca de 20% dos casos. Desconhece-se a verdadeira causa desta deformidade, mas foram propostas várias explicações para este achado, entre as quais: o mau posicionamento da cabeça na cavidade uterina; traumatismo cervical durante o trabalho de parto (mais frequente nos partos instrumentados com uso de ventosas e fórceps), infeção peri/neonatal, isquemia arterial com défice de fluxo sanguíneo, tumor cerebral e, ainda, alterações genéticas hereditárias. 

Como se deteta?
O TMC pode manifestar-se através do aparecimento de massa cervical geralmente na porção média­inferior do músculo ECM, com cerca de 1 a 2 cm, superfície lisa, consistência dura, dolorosa, móvel, com os bordos laterais bem definidos. Pode constituir o primeiro sinal de TMC. Contudo, em alguns casos, o TMC desenvolve-se na ausência de qualquer massa palpável, devido a um processo de fibrose do músculo ECM. Torna-se evidente pelo facto de o bebé assumir uma posição preferencial da cabeça para um lado. Geralmente é unilateral, torna-se evidente a partir da segunda semana de vida. O envolvimento bilateral é raro, tornando o diagnóstico mais complicado e tardio. 

Independentemente da sua forma de apresentação, o TMC pode traduzir-se: - numa limitação dos movimentos cervicais (nem sempre presente); - inclinação do pescoço para o lado do encurtamento do músculo ECM afetado; - rotação do pescoço, com orientação da face para o lado contrário. 

Como se trata? 
O TMC pode resolver espontaneamente ou, pelo contrário, se não for tratado, pode conduzir a deformidades significativas e permanentes (ex.: deformidades faciais, cranianas e da coluna vertebral, incapacidade e dor crónica significativas). Em cerca de 80% dos casos, o TMC resolve com tratamento conservador mediante um programa de medicina física e reabilitação. O tratamento fisiátrico dura, em média, cerca de 4 a 7 meses, sendo tanto maior, quanto mais tarde for iniciado ou quanto maior for a gravidade do TMC. Além das sessões de fisioterapia, este tratamento compreende também um conjunto de cuidados domiciliários, cuja realização diária, integrada na rotina familiar, se encontra ao encargo dos pais/cuidadores. Esta abordagem mais intensiva traduz-se em melhores resultados na resolução do TMC, num período mais curto de tempo. 

1. Técnicas de posicionamento da cabeça e pescoço:
Durante a alimentação: colocar a cabeça da criança numa posição de modo a que ela rode o pescoço para o lado do músculo ECM afetado.
Exemplo: Se o seu bebé apresenta um torcicolo direito, ampare a sua cabecinha com o braço esquerdo, de modo que ele tenha que efetuar um movimento de rotação do pescoço para o lado direito (para o lado afetado) para se alimentar ao seu seio esquerdo ou para beber pelo biberão.

Berço: posicioná-lo de modo que a criança rode o pescoço para o lado afetado para ver a porta, a janela, a cama dos pais ou algo que chame a sua atenção.
Exemplo: Se o seu bebé tem um torcicolo direito, posicione o berço de forma a que o lado esquerdo dele se encontre voltado para a parede, de modo que ele seja obrigado a rodar o pescoço para o lado direito para poder ver o centro do quarto.

Brinquedos e acessórios: posicioná-los do mesmo lado do músculo afetado.
Exemplo: Se o seu bebé tem um torcicolo direito, coloque os brinquedos / mobile no topo do berço, à direita.

2. Técnicas de estiramento muscular passivo:
A criança deve estar relaxada, não criando resistência. Os exercícios devem ser realizados, duas vezes por dia, cada manobra repetida 4 a 5 vezes (cerca de 10 segundos em cada posição). 

Manobra de rotação queixo-ombro: com a criança sentada, colocar uma mão sobre o ombro do lado não afetado, estabilizando-o, e com auxílio da outra mão rodar gentilmente o queixo da criança de modo que este se aproxime o máximo possível do ombro do lado afetado. 

Manobra de inclinação orelha-ombro: com a criança sentada, colocar uma mão sobre o ombro do lado afetado, estabilizando-o e com auxílio da outra mão efetuar um movimento de inclinação da cabeça para o lado contrário ao do músculo ECM afetado (aproximando a orelha do ombro contralateral à lesão). 

3. Técnicas de estiramento muscular ativo:

Nesta fase, os exercícios de estiramento devem envolver um componente ativo, voluntário, em que a própria criança é conduzida a efetuar os movimentos para o lado afetado em variados contextos (a brincar, a comer, no banho, etc.), com recurso a variados estímulos visuais, auditivos e tácteis. O recurso à cirurgia é necessário em apenas 20% dos casos, em que a criança mantém, após 12 meses de tratamento conservador, uma ou mais das seguintes condições: - limitação do movimento do pescoço; - inclinação significativa da cabeça; persistência da tumefação do músculo ECM; - deformidade craniana significativa e assimetria facial. 

Os resultados obtidos através da cirurgia corretiva são bons, com taxas de recuperação completa a rondar os 88%.


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